Os relatos de observação OVNI/UAP, registados em território português, têm uma história significativa, atendendo ao número de habitantes do país, embora longe da realidade de outras latitudes, em que se destacam, no gráfico das ocorrências, dois “picos” (séc. XX):
Um primeiro, na década de cinquenta, com 87 registos e outro, cerca de vinte anos depois, na década de setenta, com 240 registos.
Com início em 1910 e pelo período de um século, contabilizamos um pouco mais de 700 relatos (717, mais concretamente), incluindo as ilhas da Madeira e Porto Santo e o arquipélago dos Açores, para além das províncias ultramarinas portuguesas, até à respetiva independência (1975). Devemos esclarecer, contudo, que, muito provavelmente, vários desses relatos se referem ao mesmo caso, pois há fenómenos, com as mesmas características, observados, praticamente em simultâneo, um pouco por todo o território nacional.
Mas vejamos um resumo contabilístico destes dados:
Número total de casos (1910-2010) 717 100%
Casos negativos 230 32%
Casos duvidosos 359 50%
Casos com escassa informação 107 5%
Casos credíveis 21 3%
Observações noturnas 580 81%
Observações diurnas 137 19%
A recolha e análise desse conjunto de “fenómenos anómalos”, teve a responsabilidade de um conjunto de organizações privadas, nomeadamente: o CEAFI – Centro de Estudos Astronómicos e de Fenómenos Insólitos (1975 – 1984), a CNIFO – Comissão Nacional de Investigação do Fenómeno Ovni (1984 – 1996), a SPEC – Sociedade Portuguesa de Exploração Científica (1997 – 1999), entre outras, de menor expressão (que tiveram um tempo de existência muito efémero), e o CTEC – Centro Transdisciplinar de Estudos da Consciência, no âmbito da Universidade Fernando Pessoa, ainda ativo, que iniciou funções nos finais do século XX e possui, em arquivo, todo o acervo documental referente à informação OVNI/UAP portuguesa. Foi também realizada uma digitalização da maioria desse mesmo espólio (apenas não estão digitalizados os casos referentes às ex-colónias), disponível na referida Universidade.
Paralelamente, uma outra organização, a PUFOI – Investigação Ovni Portuguesa (2000 – 2020), procedeu também à recolha de alguns casos OVNI/UAP, que já estão contabilizados na casuística considerada. Depois, durante cerca de uma década (entre 2010 e 2019), os registos de atividade OVNI/UAP, são praticamente inexistentes, com exceção de dois casos, em cada um dos anos (2013 e 2018) e um outro evento, em 2019.
A partir de 2021, com o aparecimento do STELLAR – Observatório Internacional de Fenómenos Anómalos e também de uma outra organização, o CIFA – Centro de Investigação de Fenómenos Aeroespaciais, foram recolhidos uma série de relatos, nomeadamente, nos últimos três anos.
Vejamos o número de registos, em cada ano:
2021 – 19
2022 – 36
2023 – 36
Assim, estes números, somados aos anteriores, dão-nos uma estimativa de cerca de 800 relatos, dos quais, apenas cerca de uma dezena, continuam a despertar a atenção dos investigadores, pela sua estranheza e pelos elevados índices de credibilidade manifestados pelas testemunhas ou por circunstâncias específicas, continuando, até aos nossos dias, catalogados como “não identificados”. São eles, os seguintes:
– Caso de Fátima (fenómeno de 13/10/1917);
– Caso do Aeroporto de S.ta Maria, Açores – 20/09/1954;
– Caso Lemos Ferreira – 4/09/1957;
– Caso de Évora – 2/12/1959;
– Caso da Ilha Terceira, Açores – 31/01/1968;
– Caso de Alfeizerão – 09/1975
– Caso da Barragem do Castelo do Bode – 17/06/1977;
– Caso da OTA – 2/11/1982;
– Caso de Alfena – 10/09/1990.
Estamos a falar em 9 casos (em 800), o que nos apresenta uma percentagem de pouco mais de 1% de “não identificados” (1,1%, mais concretamente).
Seguidamente, apresentamos algumas imagens que procuram consubstanciar as morfologias de alguns dos fenómenos observados:

Caso Lemos Ferreira

Caso Évora

Caso Alfeizeirão

Caso Castelo de Bode

Caso Ota

Caso Alfena
Os restantes, enquadram-se em várias realidades: Fenómenos astronómicos, satélites, aviões, balões, drones, fraudes (hoje muito em voga, com a proliferação de todo o tipo de notícia, fotografias e vídeos, que se apresentam, nomeadamente nas redes sociais / internet), nuvens bizarras e um sem número de outras normalidades, para além de planetas (com destaque para Vénus), estrelas e até a própria Lua (em situações específicas, como nevoeiro e obstáculos em interposição).
Esmiuçando um pouco mais a realidade da casuística portuguesa, e utilizando a classificação Hynek (*), verificamos o seguinte resultado aproximado, em percentagem:
LUZES NOTURNAS – 60,0%;
DISCOS DIURNOS – 18,0%;
RADAR-VISUAL – 0,1%;
ENCONTROS IMEDIATOS 1.º GRAU – 10,5%;
ENCONTROS IMEDIATOS 2.º GRAU – 6,4%;
ENCONTROS IMEDIATOS DO 3.º GRAU – 5%
Em termos de distribuição geográfica, o litoral apresenta a maior concentração dos relatos (76%), o que é explicado pela elevada densidade populacional, ficando o interior com os restantes (24%), como se pode observar no mapa seguinte:
Quanto à distribuição semanal, verifica-se que não há variações significativas ao longo dos sete dias. Em relação à incidência horária, podemos dizer que o pico das observações se situa entre as 21,00 e as 22,00 horas.
Em termos sazonais, a época que se destaca com o maior número de relatos é o Verão, o que não constitui surpresa, uma vez que é a altura do ano em que as pessoas mais circulam no exterior, aumentando exponencialmente as probabilidades de se aperceberem de algo visível no espaço circundante.
Metodologia utilizada para a recolha dos relatos OVNI/UAP
Sempre que os investigadores recebiam uma informação sobre um fenómeno, mais ou menos estranho, diretamente das testemunhas, ou a partir de indicações fornecidas por terceiros, analisavam-na e de seguida estabeleciam um primeiro contacto (sempre que possível, telefónico), no sentido de marcarem encontro, no local da observação ou próximo dele, para uma primeira abordagem ao caso.
Depois de uma breve fase inicial, em que o investigador/inquiridor, se apresentava, procedia-se à gravação áudio das respostas às questões colocadas pelos investigadores às testemunhas, no sentido de, no gabinete, estudar mais aprofundadamente o assunto.
Se o caso em questão fosse importante, repetiam-se posteriormente as questões principais, para se apurar da congruência em relação às primeiras. Esse procedimento efetuava-se as vezes que se julgava necessário, para esclarecer todas as dúvidas. Seguidamente, procedia-se ao preenchimento de um questionário específico, muito detalhado, em que para além de responder a um conjunto de questões acerca das características do fenómeno observado, a testemunha fazia uma representação gráfica desse mesmo fenómeno, com os pormenores essenciais (forma, dimensões, deslocação, cores, etc.).
Depois procedia-se ao preenchimento de um questionário psicológico e quando o caso em questão exigia mais aprofundamento, pediam-se às testemunhas as respetivas fichas médicas. O passo seguinte acontecia no gabinete, onde era feita uma análise de toda a informação, no sentido de verificar a possibilidade de identificação com algum fenómeno conhecido, natural ou artificial. Quando a importância do caso o justificasse eram contactadas várias entidades, tais como: Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica, Observatório Nacional da Ajuda, Instituto Português de Mineralogia, controladores do tráfego aéreo (Porto e Lisboa).
Para além disso havia contactos institucionais regulares com a GNR (Guarda Nacional Republicana), e a FAP (Força Aérea Portuguesa), pois existiam protocolos formais com essas instituições militares (talvez os primeiros estabelecidos em todo o mundo, para troca de informação, confirmação de dados e apoio logístico no terreno, no caso da GNR), para além de alguns órgãos de comunicação nacionais de maior relevo. Graças a este tipo de procedimento, eram detetadas quaisquer tentativas de fraude, invenções ou deficientes interpretações de situações normais. Só depois de toda a investigação se redigia o respetivo relatório, atribuindo-lhe no fim uma classificação, de acordo com as categorias referidas anteriormente, assim como as considerações a que se havia chegado, mas deixando-o sempre em aberto para futuras análises, nomeadamente aqueles para os quais não era encontrada uma explicação racional, à luz dos conhecimentos científicos vigentes.
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(*) J. Allen Hynek, reputado astrónomo americano, já falecido, do Lindheimer Astronomical Research Center, da Universidade de Northwestern, que fundou e dirigiu o CUFOS (Centro de Estudos sobre Ovnis, sediado em Evanston, estado do Illinois). Foi ainda conselheiro científico da Força Aérea Americana (USAF), no denominado Projeto Livro Azul (Blue Book, na sigla inglesa), encerrado em 1969.
Mário Neves
18/07/2024